domingo, 6 de junho de 2021

Repensando a Saúde Mental na Pandemia

     



    Segundo a Organização Mundial de Saúde, vivemos no país com o maior índice de pessoas afetadas por ansiedade no mundo e no quinto mais depressivo, parte dos sintomas dessas doenças se manifestam e agravam entre os 10 aos 14 anos de idade levando à população jovem até os 19 anos apresentarem os primeiros sintomas. Este quadro acaba por ser despercebido por inúmeras famílias pela falta de acesso à serviço público psicológico e psiquiátrico que ensine como perceber os primeiros sinais, lidar com eles e tratá-los da maneira adequada.

    Infelizmente a ineficiência ou inadequação das políticas públicas que deveriam garantir ao Sistema Único de Saúde exercer a função de local de acesso, tratamento a esses indivíduos e orientação adequada de seus familiares, acaba por gerar quadros assustadores quando estudados. Os pacientes em adoecimento mental acabam por sofrer pelo o descaso do Estado no fornecimento de profissionais e medicação gratuita, além de uma estigmatização e preconceito tanto na comunidade onde estão inseridos quanto nos hospitais psiquiátricos para onde são levados - institutos que na maioria das vezes violam os direitos humanos e de cidadania de muito de seus pacientes.

    Com o despontar da pandemia e das recomendações de isolamento e afastamento como forma de combate ao vírus, entra em cena uma nova problemática a ser considerada. O humano é um ser social, produto e produtor de sua própria realidade, tendo a subjetividade constituída em suas ações sociais, dentro de um contexto histórico determinado. Nesse sentido, a configuração do sofrimento mental, ou até mesmo da doença como uma das formas de organização dos processos vitais do sujeito, não podem ser analisadas em um vazio sócio-histórico. Ou seja, não podemos minimizar o impacto do distanciamento e do isolamento social impostos pela pandemia no processo de adoecimento mental, uma vez que são justamente a socialização e as redes de apoio familiares, sociais e comunitárias que fortalecem os sujeitos e os tornam humanos.

    Nesse sentido, a pandemia tem produzido significativas experiências de sofrimento mental, frutos não apenas das medidas de controle do contágio do covid-19, como o distanciamento social, mas também pelo grande desamparo advindo das políticas de abandono e de genocídio que submetem ainda mais parcelas vulneráveis da população a violentas catástrofes cotidianas. Aparentemente, não há diferença de classe, raça, gênero e sexualidade no que se refere ao contágio, mas há desigualdades gritantes no que tange às formas de exposição e de adoecimento. No Brasil, com a antiga política de morte em curso, grupos sociais, como os povos tradicionais, a população em situação de rua, a população LGBTI, trabalhadores e trabalhadoras negros, dentre outros, são jogados em zonas de menor visibilidade e de maior vulnerabilidade.

    Concomitante a isso, vivemos em uma sociedade na qual problemas de distintas naturezas são entendidos unicamente pela perspectiva biomédica, sendo assim, o sofrimento mental é patologizado e medicalizado, desconsiderando-se os determinantes e condicionantes sociais e históricos no adoecimento. Ainda não há dados epidemiológicos precisos sobre as implicações psicológicas relacionadas ao covid-19. Como temos visto no Brasil, a saúde mental do trabalhador é diretamente afetada com as condições precárias de biossegurança, as incertezas sobre a doença e a possibilidade de infectar familiares e amigos tem potencializado estados mentais com altas taxas de estresse nos trabalhadores.

    Ressaltamos aqui a política de extermínio do presidente Jair Bolsonaro que tem ido constantemente contra às recomendações da OMS, utilizando das principais ferramentas estatais e midiáticas, contribuindo para um cenário de incertezas, de medo e de desconfiança, inclusive atacando ações decretadas por governadores dos estados que tentam minimamente sanar à crise. O brasileiro não possui, no mínimo, uma projeção de quando começará a ter uma situação de saúde mais controlada em relação ao covid-19, o que torna ainda mais difícil a manutenção dos protocolos de segurança pela população, assim como da administração da angústia frente às mudanças impostas pela pandemia.

    Nas situações de isolamento e de distanciamento social há restrições em diferentes níveis do contato entre pessoas, as quais estão carregadas de dilemas éticos e geram importantes impactos econômicos, sociais e de saúde. A revisão de estudos sobre situações de isolamento e distanciamento aponta alta prevalência de efeitos psicológicos negativos, sobretudo, a incidência de humor rebaixado e irritabilidade, junto a um longo período de medo e insônia. Entre as situações próprias desse período de pandemia, tem-se que a impossibilidade de manutenção dos ritos culturais e religiosos no dia a dia, assim como nos velórios e funerais das vítimas, têm contribuído para agravar os processo de luto das perdas familiares e de amigos nesse período, o que pode acarretar, significativo sofrimento psíquico.

    Temos ainda uma outra limitação no que diz respeito aos serviços de saúde mental, com a estratégia de precarização do SUS e dos serviços da área de saúde mental, percebe-se um intenso crescimento da “virtualização” dos atendimentos psiquiátricos e psicológicos, com valores muitas vezes inalcançáveis para a população dependente dessas consultas. Esse processo de transformar demandas cotidianas em dados virtuais se estende às demais classes de trabalhadores, como os professores por exemplo, que precisam conciliar os cuidados do lar com o chamado home office.

    É notória a intensificação do sofrimento psíquico, assim como da naturalização da pobreza e das opressões sociais! A pandemia revelou de forma pungente o descaso do Estado com os vários campos que envolvem esse grande conglomerado ao qual denominamos Saúde, apesar de rotineiramente utilizamos da palavras sem termos dimensão da amplitude, ou até mesmo dizer, do conglomerado de instituições e relações de poder que a determinam, majoritariamente, desfavorecendo a classe mais pobre. Em um cenário de grandes incertezas e acentuação da ofensiva neoliberal, a luta popular por uma vida digna, e um povo forte, é cada vez mais urgente!

Uma campanha por uma vida digna!

Uma campanha pela saúde do povo!

Uma campanha pela defesa do SUS!


Por: Job Paulo/ Beatriz Oliveira



Nenhum comentário:

Postar um comentário