quarta-feira, 8 de setembro de 2021


A DETURPAÇÃO DO SETEMBRO AMARELO


Começado em 2015 como tática de prevenção ao crescente número de suicídios, o Setembro Amarelo (do dia 01 ao 31 do mês) é um momento em que diversas ONGs e iniciativas públicas e privadas se dedicam a discutir não só o suicídio, mas a saúde mental do povo brasileiro. Uma nobre iniciativa que, entretanto, em suas intervenções de maiores repercussões midiáticas apresentam apenas soluções para o combate dos sintomas, sem atentar que a grande doença (o capitalismo) precisa ser contestada para que finalmente possamos falar em saúde mental do povo brasileiro.

Na perspectiva de autores como Fromm e Guinsberg[1], o meio social oferece aos indivíduos modelos de estruturação e funcionamento da personalidade, e a subjetividade dos mesmos é constituída de acordo com tais modelos. Observando atentamente as crises políticas e sociais do Brasil na última década, é inegável pontuar que a insegurança alimentar, o desemprego, as crises parlamentares além da desesperança que paira entre jovens e adultxs quanto a qualidade de vida familiar e individual, são fatores extremamente agravantes do quadro mental da população.

Nesse ensejo, parte das campanhas do Setembro Amarelo que invadem os ambientes familiares através da televisão e internet fazem o desserviço de depositar no indivíduo as ferramentas necessárias para vencer quadros de depressão e ansiedade.  Slogans como: “Você é forte”; “Procure relaxar”; “Medite”; “Estamos juntos”, são algumas das inúmeras frases de efeito de uma campanha branca e burguesa que reforça a meritocracia.

Para um simples exemplo usaremos o cotidiano de trabalhadorxs em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador que além de terem turnos de mais de 08 horas de trabalho precisam de transportes públicos lotados para se locomoverem, ganhando um salário mínimo que mal paga transportes e alimentação super inflacionada e as necessidades familiares. Em que momento estes indivíduos poderão “meditar” para combater a ansiedade e/ou depressão?

Um “Setembro Amarelo” branco e burguês só serve para adestrar a massa trabalhadora e reforçar os ideais neoliberais. Descolonizar essas campanhas é necessário para falarmos a partir da realidade dxs subalternizadxs, precisamos de ações que mirem no combate ao capital e ao neoliberalismo, os principais vilões da saúde mental do povo brasileiro.

Campanhas por Vida Digna e soberania alimentar; organizações insurgentes dos povos indígenas, quilombolas e sertanejos; a Teia dos Povos, a Reaja e grupos políticos como os anarquistas são algumas das inúmeras formas existentes de contestação a esse modelo. Combater o capitalismo e ressignificar o trabalho é uma forma potente de suprimir os transtornos que assolam a saúde mental da população. Uma comunidade forte, com indivíduos lutando ombro-a-ombro é o verdadeiro slogan para um Setembro Amarelo. 

 



[1] CAMBAÚVA, Lenita Gama; SILVA JUNIOR, Mauricio Cardoso da. Depressão e neoliberalismo: constituição da saúde mental na atualidade. Psicologia: ciência e profissão, v. 25, p. 526-535, 2005.